quarta-feira, 2 de março de 2011

O viés da alta-costura de Maria Adelaide Amaral.

Dificilmente acompanho novela. Raras exceções como “Ciranda de Pedra” de Alcides Nogueira, pela delicadeza e elegância que conduziu a trama baseada no romance de Lygia Fagundes Telles. E atualmente a nova versão de Ti Ti Ti, de Maria Adelaide Amaral que deu vida nova aos personagens das novelas Ti ti ti e Plumas e Paetês, ambas de Cassiano Gabus Mendes e ambas da Rede Globo.
Nesta trama, Adelaide conduz, de forma muito bem humorada, a trama principal (Valentin e Jacques Leclair), como, também, as paralelas são muito bem cuidadas e construídas, mas o que me leva a escrever é a trama: Thales versus Julinho. Maria Adelaide está construindo estes dois personagens com um grande esmero e veracidade. Parecem pessoas da vida real. Parece com a vida daquele meu amigo que na adolescência era o maior pegador e depois se deparou com uma nova realidade. Que se assustava por eu me qualificar como sexual e não dentro de uma das duas gavetas hetero ou homo. Como se a vida não tivesse possibilidades. E Num dia qualquer de sol assim, numa noite qualquer de lua assim, e assim, de repente, ele se dá conta de que está amando o nosso amigo de baladas.
Sabe o cara machão que jamais ousaria pensar: nossa será que sou gay? Que jamais permitiria olhar para outro cara e ter tesão? Pois é, Thales é assim, o cara lindo, cobiçado por todas, desejado por todas e, num belo dia escuta o coração batendo acelerado: você está apaixonado e não é pela garota linda e gostosa da faculdade e sim pelo seu cabeleireiro. O mundo para! Pode ter certeza de que para. Adelaide não esta exagerando. Está sendo extremamente coerente e levando ao ar uma ótima discussão. O preconceito está, em primeiro lugar, dentro de nós mesmos.
O contraponto é, sem dúvida, perfeito: o carinha assumido, bem resolvido, que está sofrendo e odiando estar apaixonado por um (ex) hetero, ou um quase homo, enfim o cara que ainda está em cima do muro e não tem certeza para que lado vai pular ou melhor não sabe como pular sem se machucar. Por que a escolha já esta feita. Não há volta.
Está sendo muito bom assistir a construção desta trama. Armando Babaioff encarna com total entrega o Thales. Ora sensível e apaixonado, ora sem saber como resolver isso dentro de si mesmo. Suas dúvidas, seus desejos, seus receios, sua falta de coragem de ser quem realmente é. E, principalmente, o medo de não saber como o novo Thales vai ser visto e aceito. A angústia de querer o Julinho, o encanto de ter o Julinho, o desespero de perder o Julinho, o seu primeiro amor assumido.
Enfim esperamos que nesta novela a Rede Globo permita que Adelaide leve o romance dos dois às ultimas consequências, que aconteça de vez beijo gay em novela, porque isso ajuda a clarear o mundo gay, contribui para a aceitação dos gays na família, ameniza preconceitos, porque em quase toda família tem gay. O mundo está bastante gay e os gays pagam impostos, os gays fomentam vendas em shoppings, os gays estão em todas as profissões e, espantosamente, em pleno, século XXI ainda é tabu um beijo entre pessoas do mesmo sexo. Temos que descortinar os olhos, temos que abrir para o novo, visto que nem é novo, pois sempre existiram pessoas amando pessoas do mesmo sexo. Vide Alexandre o grande, ou a vida de Rimbaud e Verlaine. Enfim, no mais a vida é bela e nós somos dúvidas, incertezas e divagações...

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